Voltei ao crochê,
anos após a última touca tecida.
E foi como andar de bicicleta.
Ponto a ponto, tudo ainda estava ali.
Tudo sabido, como se ontem.
Mas um novo: estado meditativo.
Agulha na lã, no buraco, ponto e trama
enquanto passa o tempo.
O vestido que usava era de malha,
da China.
Lembrei que a dimensão do tempo se perdeu.
Antes se via nas coisas , o tempo gasto.
A demora na roupa tricotada.
As horas empenhadas no plantar do tomate.
Hoje, o que vejo, lembrada pelo crochê:
um chinês, numa fila de chineses lado a lado,
fazendo tudo muito lápido.
Não vejo tempo neste vestido, no tomate,
na boneca, nos utensílios a perder de vista
nas prateleiras das lojas made in China.
Volto ao crochê, voltemos ao crochê
e a um tempo que não volta.
Teci mais que um xale, teci uma existência
com dimensão de tempo.
Sem tempo, somos apenas tridimensionais.
Sem tempo, não há poesia.
Voltemos ao crochê.